Ele
andava pelos corredores do shopping. A postura era de alguém com algum
sofrimento psíquico, falava sozinho. De repente, ele esbravejou para duas
pessoas que conversavam ao celular e que andavam à sua frente, a uma boa
distância para não escutarem o que ele disse: "mas ô desgraça, não largam esse
celular para nada!"
Foi
um choque para mim. Menos pela ação do senhor do que pela identificação que
tive com ele. Pensei que se eu não me cuidasse eu terminaria minha vida assim.
As
pessoas são o meu inferno, já dizia meu amigo Sartre. Me solidarizo com ele. Há
coisas tão banais e corriqueiras que me irritam profundamente: numa loja, ser
mal atendido, não ser atendido, não ter um estoque apropriado para os produtos,
mandar um outro chamar o gerente, ao invés dele fazer isso, atrasando todo o
processo, consequentemente. Nos consultórios, atrasos dos ultra-deuses, também
conhecidos vulgarmente por médicos. Pessoas que não dão bom dia, nem retornam o
seu obrigado. Nem vou mencionar quando preciso de algum serviço público, como
de um Detran. No trânsito, pedestres que esperam cruzar a rua já na rua, carros
que não dão seta, não esperam o sinal ficar verde e já avançam, carros lentos
na pista da esquerda, e por aí vai. No geral, pessoas que fingem que não me
vêem, que me consideram como uma coisa, que olham para mim com aquele olhar
blasé de quem não tem nada a ver comigo, que me tratam como um amigo que não
sou – "ô véio, a gente não tem mais esse produto, foi maus!"
Percebi
que tinha que fazer algo por mim mesmo, afinal o mundo não vai mudar para me
agradar. Também não pretendo terminar meus dias gritando pelos centros de
compras. Estou tentando fazer exercícios. Começou para dirigir: antes de entrar
no carro, reviso comigo tudo que pode acontecer: além dos problemas descritos
acima, fechadas, ultrapassagens, motoqueiros… Com isso repito para mim que tudo
vai acontecer no momento em que eu sair da garagem. Quando acontece, digo para
mim mesmo “Viu? Não disse que ia ocorrer?”. E não me estresso. Ridículo? Pode
ser, mas tem me trazido um pouco de sossego.
O
que não tenho conseguido é achar tudo isso normal. Acho triste ter que lidar
com essas situações e me recuso a me acostumar com essa realidade aceitando que
isso faça parte do novo cenário da minha cidade. Continuo indignado, mas mais
manso.
No futuro?
Fico aqui imaginando o tamanho do repertório de exercícios que vou ter que
praticar.
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